- Empreendedorismo e Novos Negócios
Alumni impactando o mundo

Neste espaço, contamos histórias de transformação e impacto protagonizadas por gente da nossa rede. Essa é uma forma da comunidade conhecer outros membros, e ao mesmo tempo, divulgar trabalhos que merecem os holofotes.
Em comemoração ao mês da mulher, as entrevistadas desta edição são Anna de Souza Aranha (CGAP 2012) e Gabriela Bonotti Carpinelli (CGAP 2013), ex-alunas do Curso de Graduação em Administração Pública da FGV EAESP. Anna e Gabriela são diretoras e sócias do Quintessa, aceleradora de impacto, de onde transformam o mundo através de um empreendedorismo impulsionador de mais de 250 negócios de impacto e com mais de 5 mil startups de impacto identificadas, o Quintessa é hoje referência em inovação com impacto positivo.
Por Iamara Caroline – Equipe Alumni.
1. Anna e Gabriela, falem um pouco sobre vocês. Como foi a jornada de cada uma dentro da FGV? Como se conheceram e como esse caminho as levou a buscar um trabalho com propósito em primeiro plano?
Gabriela - Entrei na GV, em AP, certa de que em algum momento da minha carreira eu teria uma atuação junto ao setor público (quem sabe em um futuro mais distante), mas já foram nos primeiros semestres da faculdade que fui me dando conta de uma série de barreiras, burocracias e modus operandis que me afastaram cada vez mais desse objetivo inicial. Ao mesmo tempo que a faculdade me ajudou a identificar que a administração pública não era pra mim, a eletiva FIS do GVces me apresentou o mundo da sustentabilidade corporativa e um novo caminho possível para unir impacto positivo e o mundo dos negócios. No final da eletiva do FIS 5 passei no meu primeiro estágio, na área de desenvolvimento sustentável do Banco Santander, recém adquirido o Banco Real, referência em sustentabilidade sob a gestão do então presidente Fábio Barbosa. Após um ano de estágio no Banco e certa de que estava no caminho certo, quis conhecer novas possibilidades de trabalhar com impacto. Foi quando conheci o Quintessa, onde a Anna já estagiava. Até o momento eu havia conhecido a Anna em poucas interações jogando futebol juntas pela FGV.
Anna - Entrei no curso de administração pública em 2008 com a expectativa de ter uma formação em gestão com o olhar voltado para o cidadão. O desejo de trabalhar com algo relacionado a impacto vinha desde a escola, onde já no ensino fundamental tive uma apostila com o título “como conciliar desenvolvimento econômico com preservação ambiental?”. Na FGV, quis aproveitar todas as oportunidades que a faculdade oferecia. Fiz a entidade Junior Pública, onde tive contato com o terceiro setor; me aprofundei em pesquisas sobre o setor público pelo PIBIC e o Conexão Local; mergulhei na temática de sustentabilidade por meio de eletivas do GVCEs, como o FIS; fiz algumas matérias na dupla graduação com o curso de direito; fiz estágio em uma empresa de economia mista, que me ajudou a reforçar que não queria começar minha carreira no setor público; e ganhei uma bolsa para fazer intercâmbio internacional. Conto isso porque de fato acho que há muito a se aproveitar dentro da faculdade para aprender e testar o que de fato nos motiva. Com isso, achava que trabalharia em uma consultoria de sustentabilidade O encontro que tive com empreendedorismo de impacto se deu em um evento que participei durante o intercâmbio - e, na volta para o Brasil, ao final de 2011, pude conhecer o Quintessa, que havia sido criado em 2009 (pelo Leo Figueiredo, por acaso, também alumni FGV EAESP).
2. O Quintessa é uma das principais aceleradoras de negócios de impacto social e ambiental do país, pelo qual já passaram diversos negócios que são referência para o setor. Como é o cotidiano dentro da empresa e que competências e habilidades são cruciais para empreender esse negócio?
O cotidiano é muito dinâmico. O tempo todo lidamos com uma multiplicidade de segmentos de mercado (saúde, educação, meio ambiente, etc.), tipos de empresas (serviços, produtos, tecnologia, Saas, etc.), atores (empreendedores, grandes empresas, institutos, fundações, investidores, famílias empresárias, etc.), temáticas de gestão (estratégia, financeiro, comercial, gestão de pessoas, processos, etc.). É também um cotidiano que demanda visão sistêmica e capacidade de lidar com desafios complexos. Assim, é essencial a capacidade técnica, no sentido de termos um bom embasamento em áreas de gestão de negócios; uma capacidade relacional, dado que estamos o tempo todo criando vínculo com diferentes atores e mediando conexões entre eles; um olhar humano, com alinhamento à nossa cultura e valores, que valoriza as pessoas e fomenta uma gestão consciente e humana; uma constante curiosidade para aprender sobre coisas novas, seja para promover melhorias contínuas ao que já fazemos, seja para inovar e expandir nossas áreas de atuação; coragem e proatividade para experimentar o novo; e habilidades já conhecidas dentro do universo de sustentabilidade, como o pensamento coletivo e de longo prazo.
3. Uma das principais questões para as empresas ligadas ao terceiro setor é justamente a captação de recursos. O Quintessa não depende de doações desde 2016, tendo iniciado com um programa de aceleração que cabe no bolso dos empreendedores e depois incluído frentes com grandes empresas, institutos, fundações e investidores. Como foi a transição desse processo e qual foi o impacto na vida da empresa? E qual dica vocês passariam para empreendedores que desejam viver essa transição?
O Quintessa começou sua trajetória com um modelo baseado na doação de seu fundador. Porém, o assunto “modelo de negócio” se estabeleceu desde o início, em 2013. Começamos a falar sobre isso com duas grandes motivações: retenção de talentos, no sentido de ter a perspectiva de que não seria um trabalho temporário, mas que as pessoas poderiam se projetar no longo prazo, construindo sua carreira aqui dentro; e consistência, no sentido de que trabalhávamos junto a negócios de impacto, ajudando eles a terem sustentabilidade financeira, e não queríamos ir na contramão, dependendo de doação. Havia também um terceiro elemento, que o próprio fundador estava alinhado em perpetuar o legado do Quintessa, sem a organização depender dele no futuro. Passamos anos investigando caminhos possíveis para nosso modelo de negócio, estudando benchmarks nacionais e internacionais. A resposta, porém, veio de dentro de casa e de um movimento de nós duas em assumir o risco financeiro da operação, ao final de 2016. Começamos com contrapartida dos empreendedores acelerados, que custeava o programa, porém era subsidiada. Com o tempo, expandimos a atuação junto aos outros atores, criando programas junto a grandes empresas, institutos, fundações, investidores, famílias empresárias. Essa transição foi muito positiva para o Quintessa. Nos ajudou a atuar de forma mais sistêmica e com maior potencial de gerar impacto, enxergando não apenas os empreendedores, mas essa multiplicidade de atores como agentes de transformação. Fez aumentar a quantidade de iniciativas que realizamos, gerando de fato mais impacto na ponta. E nos permitiu atrair talentos incríveis, sabendo que poderiam realizar no Quintessa seu desejo de protagonizar soluções relevantes e empreender. A dica que podemos passar, de forma resumida, é: escute o mercado (o tempo todo perguntamos para os empreendedores e outros atores o que lhes agrega valor, como nos enxergam, a satisfação da experiência conosco, etc.); entenda o que você deseja fazer e com o que deseja se comprometer a longo prazo (trazemos os elementos de motivação pessoal e valores para embasar nossas decisões também); tenha coragem de arriscar (muitas das nossas frentes de atuação eram apostas com potencial, que apenas se concretizaram porque fomos testar na prática a possibilidade). Por último, tenha atenção às crenças que podem estar limitando sua visão, como achar que impacto socioambiental e retorno financeiro não poderiam ser alinhados e integrados.
4. Em comemoração ao mês da Mulher marcado pelo dia 8 de março: Espera-se que no setor dois e meio (2.5), os profissionais sejam conscientes. Dentro desse ambiente de negócios o preconceito de gênero é inexistente? Vocês já enfrentaram algum desafio ou preconceito por serem mulheres e como é a atuação de vocês, olhando o recorte de gênero, na direção de uma grande empresa?
Infelizmente não dá pra afirmar que o preconceito é inexistente no setor 2.5, mas vemos como mais pontual ou menos frequente se comparado a outros segmentos, dado a correlação que existe com o fato das pessoas terem se proposto a trabalhar com foco em gerar impacto positivo. Nunca passamos por nenhuma situação de discriminação explícita, mas com certeza já vivenciamos diversas situações e reuniões onde o machismo aflorou, no sentido de haver viés em quem ocupou o espaço, de vermos reduzida a possibilidade de nos expressarmos, de identificarmos uma dúvida acerca da nossa capacidade de afirmar aquela opinião ou realizar aquela entrega, de sermos interrompidas nas nossas falas - sem ao menos a pessoa nos conhecer. Já vivenciamos também aquela típica situação de um empreendedor fazer elogios sobre estética/físico, sem entender a inadequação disso em um ambiente profissional. Começamos nossa trajetória no Quintessa muito jovens, por volta dos 22 anos, e assumimos uma posição de liderança e acesso a um diálogo com liderança e C-level de outras organizações muito rapidamente. Ser líder sendo uma mulher jovem, com certeza fez a trajetória ser mais difícil no contexto de existir um preconceito de gênero. Em contraponto, sempre tivemos o suporte de mentores e conselheiros que nos apoiaram e impulsionaram para que ocupassemos essa posição. O ponto positivo de tudo isso é que no Quintessa pudemos romper com esses padrões com o respaldo máximo da representatividade de uma liderança feminina, representada por nós duas como co-CEOs. Além disso, no Quintessa temos 72 % do time sendo mulheres e 83 % da liderança também feminina. É curioso (e triste) ver como essa realidade ainda gera estranhamento para algumas pessoas.
5. Nos aproximamos do final. Uma frase inspiradora ou de impacto que gostariam de deixar para os nossos leitores?
Gabriela - No final de 2012 completamos um ciclo de 10 anos no Quintessa e de uma atuação empreendedora. Meu grande aprendizado, que foi muito surpreendente pra mim inclusive, é o potencial de transformação que um grupo de pessoas engajadas, conectadas e alinhadas ao mesmo propósito é capaz de fazer. Entrei no Quintessa inspirada pela nossa causa e permaneço no Quintessa inspirada diariamente pelas pessoas com quem eu convivo. Nosso time, nossos(as) mentores(as), empreendedores(as) e parceiros(as). Portanto, se eu pudesse deixar alguma mensagem/recomendação final é: escolha muito bem as pessoas que vão dividir a jornada com você, pois muitas vezes, elas terão que ser o motor de motivação quando nem você sabe bem para onde está indo! :)
Anna - Apesar de serem já bem conhecidas, gosto muito de duas frases que me inspiram: “Não sabendo que era impossível, foi lá e fez”, que expressa muito do que foi nossa vivência nesses últimos anos, descobrindo novas formas de atuação por meio da prática e do embasamento em nossas crenças, e “Seja a mudança que você quer ver no mundo”, que diz sobre nossa cultura e contínua prática de buscarmos ser consistentes com nossos valores.
Anna de Souza Aranha é sócia e diretora do Quintessa, desde 2012 trabalha pela integração estratégica de negócios e impacto positivo. Impulsiona startups que resolvem desafios socioambientais e promove as agendas de inovação, impacto positivo e ESG entre grandes empresas, investidores, institutos e fundações. Formada administradora pela FGV, cursou Stanford Ignite com foco em empreendedorismo e inovação. Atua como especialista no setor, é colunista na Reset e Um Só Planeta e conselheira de iniciativas como Aliança pelo Impacto, Base Colaborativa e GVentures.
Gabriela Bonotti é formada em Administração pela FGV, (Fundação Getúlio Vargas - EAESP) iniciou a carreira no Banco Santander, na área de desenvolvimento sustentável, onde atuou em projetos relacionados à inclusão da sustentabilidade na governança estratégica do Banco. Em 2012 ingressou no Quintessa como gestora de acelerações e após conduzir 12 acelerações de negócios de impacto como Courrieros, Nave a Vela e as captações de investimento de Hand Talk e TNH Health (atual Vitalk), assumiu em 2016 a Diretoria de Projetos. Hoje é responsável pela coordenação de todos os programas de aceleração, dos programas em parceria com grandes empresas e captações de investimento para os acelerados, além dos assuntos estratégicos da organização.
Por Iamara Caroline - Equipe Alumni