- Clima; Gestão Empresarial
As disfunções no "home office"
Por Sérgio Amad Costa, professor de Recursos Humanos e Relações Trabalhistas da FGV EAESP.
Escrevi, nesta coluna, alguns artigos sobre home office . O primeiro foi publicado em 2/4/2013, Home office, uma tendência irreversível . Já naquela época, advertia que as empresas deveriam estar preparadas para essa nova modalidade de trabalho e alertava que o trabalho remoto tinha vindo para ficar.
O home office não é um modismo nem a sua utilização é apenas uma saída encontrada para trabalharmos durante a pandemia. O trabalho a distância tem suas razões econômicas e tecnológicas. No que concerne à economia, cito três. Uma é que possibilita reduzir o espaço físico da empresa, cujo custo do imóvel se torna mais elevado a cada ano, além de esse espaço físico ficar ocioso em boa parte do tempo, com horas noturnas, fins de semana e feriados.
Outro motivo que mostra a razão econômica para o uso do home office está ligado à questão da mobilidade dos profissionais, no deslocamento de casa para a empresa. A economia se dá com o transporte e o tempo gasto no trânsito. Finalmente, há a globalização, que já exige o trabalho a distância entre membros de uma mesma equipe de profissionais atuando simultaneamente em diferentes regiões, aculturando-os a trabalhar dessa forma, economizando tempo, transportes e hospedagens para se encontrarem.
Quanto à razão tecnológica para a utilização do home offic e, ela se manifesta no próprio desenvolvimento dos meios de comunicação, fazendo com que atividades presenciais sejam substituídas pelas virtuais. As diversas plataformas, aplicativos, etc., têm nos impelido ao relacionamento a distância. E isso nos leva à consciência de que várias atividades no trabalho, na sede da empresa, não fazem mais sentido serem, necessariamente, realizadas de forma presencial.
Entretanto, o home office passou a ser, nesta época de quarentena, amplamente difundido e utilizado, de forma generalizada, em razão da necessidade urgente para enfrentar, agora, um momento de total anormalidade. O resultado disso é uma série de disfunções geradoras de estresse para muitos profissionais e de baixa produtividade no trabalho.
Cito algumas dessas disfunções no home office durante a pandemia. Primeira, pelo fato de as empresas terem sido pegas de surpresa, o trabalho a distância começou a ser feito pela maioria das pessoas sem nenhum treinamento e com recursos tecnológicos muito limitados. Segunda: o trabalho remoto está sendo realizado num regime de confinamento. Isso significa que as alternativas de lazer, para descansar após a labuta, giram em torno da tecnologia em geral, sem permitir que as pessoas se encontrem pessoalmente.
Mas as disfunções no home office não param por aí. A terceira reside no fato de que as atividades profissionais a distância estão acontecendo num momento de extrema tensão quanto à saúde das pessoas e à economia do País. Quarta: o trabalho remoto está sendo praticado num contexto de mudanças bruscas na rotina das pessoas, com várias novas atribuições, inclusive os cuidados em tempo integral das crianças, que não podem ir para a escola. Assim se instaura a desorganização do tempo do trabalho e do espaço físico da moradia. Finalmente, cumpre lembrar que há profissionais que não têm as condições de trabalhar em casa. Isso por não possuírem recursos tecnológicos ou porque moram em situações sem nenhuma possibilidade de se concentrarem no trabalho.
O fato é que essas e outras disfunções, oriundas das circunstâncias desta fase crítica, fazem com que o verdadeiro home office esteja sendo, não raro, substituído pelo simples e desestruturado home working , na base do "vamos fazendo o que é possível" e do "é o que temos para o momento". Este sim, gerador de estresse e de baixa produtividade. Porém, quando a pandemia passar, o home office bem arquitetado, definitivamente, será o que já há anos vínhamos assinalando: uma modalidade de trabalho que veio para ficar.
*Artigo originalmente publicado na coluna Opinião do Jornal O Estado de S. Paulo